terça-feira, 6 de dezembro de 2011

João: o poeta sapateiro

Este trabalho tem por objetivo analisar as contribuições de João Sapateiro para a cultura Sergipana, fazendo uma análise e reflexiva sobre o que é cultura, e como esse poeta contribuiu para o enriquecimento da cultura de nosso estado. Visto que as manifestações artísticas são inerentes à própria vida social, não havendo sociedade que não as manifeste como elemento necessário à sua sobrevivência Para tanto, pesquisa a sites, estudos de obras teóricas, foram as ferramentas metodológicas utilizadas para alcançar o objetivo proposto.
Cultura s.f. 1. Acervo intelectual e espiritual. 2. Conjunto de conhecimentos adquiridos; instrução, saber. 3. Conhecimentos em um domínio particular. 4. Conjunto de estruturas sociais, religiosas, etc., de manifestações intelectuais, artísticas, etc., que caracterizam uma sociedade. (Larousse, p. 262, 2001)
“literatura” é arte que tem por matéria prima a palavra, e utilizando-se de técnicas faz-se da palavra um instrumento poderoso na construção do que se pretende - recriar a realidade.
A poesia está nesse contexto literário, pois, entende-se por poesia uma obra literária em versos, ou seja:
Poesia s.f. (gr. Poieses, criação), 1. Forma de expressão lingüística destinada a evocar sensações, impressões e emoções por meio da união de sons, ritmos e harmonia, geralmente em versos. (Larousse, p. 777, 2001)

João Silva Franco. Negro, quase dois metros de altura, teve a vida marcada pelo sobrenome postiço. Profissionalizou-se como sapateiro, remendando o couro, trocando o salto, pondo meia sola nos sapatos da população. Discreto, mas de boa conversa, o sapateiro exibia na sua oficina de trabalho, folhas de papel pautado, repletas de palavras escritas em letras de forma, fixadas nas paredes e nos poucos móveis do seu canto laboral. Eram trovas, pequenos e longos poemas, que surpreendiam a freguesia. João Silva Franco passou a ser conhecido como João Sapateiro, e reconhecido como o sapateiro poeta.
Vimos um pouco da biografia deste autor. Com isso pudemos refletir como este homem, sem condições (em se tratando de condições financeiras) conseguiu produzir tantas poesias em meio à correria da vida de trabalhador e chefe de família. Sendo, portanto, um vencedor, um exemplo de persistência, de amor a arte.
Pesquisando as expressões culturais de Sergipe, vimos que é de uma grandeza relevante, visto que somos o menor Estado da Federação. Pesquisamos e vimos a literatura folclórica, com seus versos, cordéis, cantoria de improviso, as lendas, os mitos, adivinhações, contos, nomes de famosos como Tobias Barreto, Silvio Romero, enfim, vários nomes, várias manifestações, mas de tudo que pesquisamos, nada, ou quase nada encontramos  para situar o nosso poeta João Sapateiro nessa cultura. Subtende-se que este modesto e brilhante poeta não foi reconhecido o suficiente para ter seu nome estampado em livros, situando-o como pertencente à cultura de elite ou popular. Restando o questionamento: Suas poesias são consideradas literatura? Lembrando que “literatura” é arte que tem por matéria prima a palavra, e utilizando-se de técnicas faz-se da palavra um instrumento poderoso na construção do que se pretende - recriar a realidade.
Separamos, para análise reflexiva, o poema abaixo, a fim de entendermos o fundamento das produções de João Sapateiro. Este que reproduziu em seus trabalhos, seus sentimentos, suas ideologias.  Sendo, portanto, um brilhante poeta, ainda que não reconhecido no meio literário.



Cântico
Aos Laranjeirenses


Minha terna  Laranjeiras,
Terra das lindas palmeiras,
Adoro tudo que é teu;
Admiro os belos prados,
E adoro os lindos trinados,
Das aves que Deus te deu.

O teu passado eu bendigo,
E adoro o “Bom gosto” amigo,
Aonde vou me banhar;
Adoro a meiga corrente
Que canta canção dolente
Andando em busca do mar.

Adoro a tua Matriz,
Aonde a velhinha feliz
Vai rezar o seu rosário;
Amo o teu belo Cruzeiro
Que lá no cimo do outeiro
Nos lembra o Monte Calvário.

Amo a tua marujada,
E adoro a Pedra Furada,
Que nos encanta e fascina!
Gosto da policromia
E da coreografia
Da Taieira de “Bilina”.

Amo os sinos  maviosos
E os teus jardins olorosos
Que te dão tanta beleza!
Amo as igrejas dos montes,
Amo as tuas velhas pontes
Que fazem lembrar Veneza.

Admiro o candomblé,
E o zabumba do José,
Torrentes de poesia!
Amo a face angustiada,
Da imagem cobiçada
Do Senhor da Pedra Fria.

Admiro a Matriana,
Aonde em fins de semana
O povo vai repousar;
E adoro o Barro Vermelho,
Que fez do rio um espelho
Onde vive a se mirar.

Eu gosto dos Penitentes
Que contritos, reverentes,
Rezam por todos do além.
-  E é com orgulho que falo
Na dança de São Gonçalo,
Que nos encanta e faz bem.


Eu adoro as procissões
Que povos de outros rincões
Não deixam de acompanhar;
E os teus velórios cantados
Que nos deixam encantados
Esquecidos de chorar.

Amo ao Samba de Tropelo,
Coco, Forró e Martelo,
Bacamarte e Batalhão;
E as tuas garotas belas,
Cantando trovas singelas
Nas rodas de São João.

Amo a vista deslumbrante,
E a brisa acariciante
Do morro de Bom Jesus;
O Serra-Velho, dioso,
E o mês de doloroso,
Que aos namorados seduz.

Adoro o teu céu de anil,
Amo o teu povo gentil,
Amo tudo que é de ti;
Eu amo os tamarindeiros
Eu amo os velhos coqueiros
Onde canta o bem-te-vi.

Admiro os Caboclinhos,
E os Negros do Rei  Raminho,
Lamentando o cativeiro;
E a cantoria bonita
Da turma de João de Pita,
No dia seis de janeiro.

Adoro os velhos sobrados,
Aonde em tempos passados
Se cultivava o lirismo;
E os bancos da Conceição,
Onde sentou-se a paixão
No tempo do romantismo.

Adoro a rua Direita,
Porque quanto mais se ajeita,
Fica bem mais sinuosa;
E o Alto do Xavier
Que mostra pra quem quiser,
O quanto és  majestosa!

Minh’alma também é louca
Por ti, cidade barroca,
Residência do saber;
Terra de João Ribeiro,
Meu amor é verdadeiro,
E te adoro até morrer!.

Percebe-se que o poema “Cântico aos Laranjeirenses” trata-se de um poema laudatório, que João, filho adotivo da cidade de laranjeiras, produziu enaltecendo sua terra querida.
João inicia os versos exaltando a terra de lindas palmeiras, com belos campos e aves mandadas por Deus. Ele fala da Igreja  Matriz com seu belo cruzeiro, que o faz lembrar o Monte Calvário, das manifestações artísticas – a taieira, o candomblé, a dança de São Gonçalo; expressa ainda seu  carinho pelo rio com seu  barro vermelho que vivia a mirar,  pelo povo daquela terra- povo gentil,  os prédios antigos com sua beleza lírica encravada em sua história. Enfim, João expressa em cada verso seu amor pela terra que o acolheu, e em gratidão o tornou um filho ilustre.
Finalizando este singelo trabalho, temos então o conhecimento de que cultura, ou manifestações artísticas, são inerentes à prática social, não havendo sociedade, portanto,  que não às manifeste. Sendo, portanto, um elemento necessário para a efetivação da  expressão humana.  E  que poesia é uma arte literária em forma de versos que tem como objetivo expressar e evocar sensações, emoções. Conhecemos, ainda, um pouco deste ilustre sergipano - João Silva Franco - que com sua arte compôs muitos poemas em meio à sua rotina de sapateiro, utilizando-se da arte para expressa-se e manifestar seus mais profundos desejos e pensamentos acerca de diversos temas. Podemos então concluir que este sergipano, adotado por uma cidade rica em cultura, soube aproveitar cada elemento a ele oferecido transformando em arte e revelando-se através de suas poesias. Podemos, então, responder ao questionamento proposto anteriormente: Suas poesias são consideradas texto poético? Ou apenas um trovador que compunha ao exercer seu ofício de sapateiro?

As poesias de João são consideradas parte da cultura popular sergipana. Embora não tenha se tornado um nome famoso entre os nomes de literários como Silvio Romero, Tobias Barreto, Hermes Fontes, sua poesia  é de grande importância para a consolidação de nossa cultura. A exemplo desse reconhecimento lembremos que seu nome foi o escolhido para  estampar o I Prêmio de Poesia Popular João Sapateiro em 2009.


O OFICO DAS REZADEIRAS EM SERGIPE

Diz à tradição que o ato de benzer, ou de curar, é a ritualização das coisas da fé, onde muitas vezes se misturam o sagrado e o profano. Herança dos portugueses que ao chegarem ao Brasil sofreram influências dos índios e, posteriormente, dos africanos, sobretudo as mulheres. O conhecimento das plantas.  Quebranto, cobreiro, mau-olhado, espinhela caída, erisipela, vento virado, peito arrotado. Quem quer que percorra os povoados da zona rural, as pequenas cidades do interior ou mesmo as periferias das grandes cidades vai se deparar, em um momento ou outro, com alguns desses nomes que fazem parte de um mundo mágico-religioso, povoado de rezas, crenças, simpatias e benzeções. Na cultura popular, corpo e espírito não se separam, tão pouco se desliga o homem do cosmos, ou a vida da religião. Para todos os males que atingem o corpo e a alma do homem sempre há uma reza para curar. É por isso que, apesar do tempo e dos avanços da medicina, a tradição dos benzedores ainda persiste na nossa moderna sociedade capitalista. Acreditando ou não no poder da reza, tem sempre aqueles que procuram, nas rezas e na benzeções, uma cura para a sua doença ou um alívio para a sua dor.


Não há uma estimativa de quantas mulheres atuam como rezadeiras em Sergipe. Existem ainda os rezadeiros, mas também é difícil informar com precisão o número de homens exercendo  esse ofício no estado. A prática de rezar tem diminuído, mas o professor de Antropologia da Universidade Federal de Sergipe, Jonatas Silva Meneses, afirma que ela resistirá ainda por um bom tempo. As rezadeiras têm algumas coisas em comum: a simplicidade e a fé, por exemplo. Invoca o nome de Deus o tempo todo. Na hora de rezar, misturam orações como o Pai-Nosso, Ave-Maria e o Credo com truques da magia.

Em sua maioria, são católicos. É um freqüentador de igreja. Mas há caso, mas com raríssimas exceções, em que essas pessoas estão ligadas à religiosidade afro-brasileira ou ao espiritismo. Vivem em casas humildes, onde podemos encontrar sobre móveis da sala ou do quarto imagens de santos. Nos quintais, cultivam as plantas que "curam". Ramos de pinhão roxo, arruda, aroeira e guiné são algumas das plantas utilizadas para "benzação". Cada uma é usada para um tipo de enfermidade.  As rezadeiras, em sua maioria, são católicas, embora, suas ações não correspondam às exigências da Igreja Católica. Isso porque elas pertencem ao que chamamos de catolicismo popular. Esse completamente tomado de símbolos e comportamentos criados e adaptados a partir das crenças e experiências de vida, também se configuram em uma grande força de resistência. Tais aspectos imprimem uma inevitável relação entre a ação cotidiana das rezadeiras e a preservação da memória de uma determinada comunidade.

     A benzeção é a mais viva forma da cultura nascida do povo e praticada pelo povo. O povo guarda as suas cantigas, seus remédios, suas preces, suas devoções, seus rituais de trabalho, enquanto tiverem algum sentido na vida deles. Os benzedores tratam seus doentes com rezas, simpatias e remédios que não se contradizem em nenhum momento. Eles transmitem uma grande paz e pelejam com o doente. Diante do tratamento dado pelos benzedores, é fácil enxergar que eles representam valores. Para nós, é impossível imitar suas rezas, simpatias e benzeções. Tudo isso está perfeitamente adaptado à vida dos benzedores e à dos seus doentes, mas muito diferente da nossa vida. É preciso tentar entender as suas histórias e suas realidades, seu modo de pensar, a partir dele próprio, da sua visão de mundo, que é bem diferente da nossa. É grande a diferença entre o oficial e o popular, desde o lugar do tratamento, os nomes dados aos membros do corpo até a própria interpretação da doença e, conseqüentemente, à prática dos benzedores. “Não podemos, portanto, continuar a ignorar o pensamento da metade da população brasileira, se quisermos efetivamente corresponder à expectativa da cultura e da civilização do nosso tempo.
 
As vozes presentes nos sussurros rezados têm muito a nos dizer, por serem oriundas de diferentes épocas. Trata-se de um eco que une diferentes períodos, passado e presente. O próprio ritual já pode ser visto como um discurso, com linguagem própria e que tem muito a revelar. Por fim, ao pronunciar as palavras mágicas “com dois te botaram, com três Jesus Cristo tira”, podemos observar aspectos que vão além de rezas e galhos, são os sujeitos históricos inseridos em campo, detentoras de complexo universo simbólico, da eficácia de cura, de poder. 
Antonio Marcos Lima da Silva
    Damares dos Santos
   Jairo Camilo Ferreira
   Jocimar dos Santos silva
Leidivalda Dorotéia Dorotéia da Silva